O grito negro na cena artística contemporânea
- ciavozdaterra
- 30 de nov. de 2022
- 4 min de leitura
Falaremos de uma atriz, de uma dramaturga e de uma diretora teatral, dedicada a estudar, com extrema perseverança, a conscientização do valor e da riqueza cultural do negro na cena artística contemporânea: Dirce Thomaz.

FOTO MANDELACREW. IMAGENS DE ARQUIVO CEDIDAS PELA ARTISTA
Tem artigos publicados e inúmeros trabalhos sobre a carência de companhias que montam espetáculos com personagens negros. Exceção feita à COMPANHIA TEATRAL MACUNAÍMA, com direção de Antunes Filho, que levou à público, a peça “Xica da Silva”, com protagonização de Dirce Thomaz. Estreou em 1988, ano do centenário da abolição da escravatura e se apresentou na abertura das Olimpíadas de Seul, na Coreia do Sul.
Em 1989, a reabertura do TUCA, o teatro da PUC (Pontifícia Universidade Católica de São Paulo), se deu com a encenação do texto dramatúrgico “Os negros” de Jean Genet, dirigido por Maurício Abud. Contou com a participação de Dirce Thomaz e outros grandes nomes de atores negros consagrados, como: Lizete Negreiros, João Acaiabe, Gésio Amadeu, Eduardo Silva, Luiz Pilar e Cida Moreno.

FOTO MANDELACREW. IMAGENS DE ARQUIVO CEDIDAS PELA ARTISTA
A partir destas experiências, Dirce criou, em 1992, o CENTRO DE DRAMATURGIA E PESQUISA SOBRE CULTURA NEGRA inaugurado no auditório da Biblioteca Monteiro Lobato, no bairro de Vila Buarque, em São Paulo. No ano 2000, a fundadora rebatiza o centro com o nome: CENTRO DE DESENVOLVIMENTO CULTURAL E SOCIAL MARIA THOMAZIA DE JESUS, em homenagem a sua mãe, dando origem à TRUPE INVASORES COMPANHIA EXPERIMENTAL DE TEATRO NEGRO. No mesmo ano, ela ministrou aula na disciplina de literatura, para o cursinho dos alunos da PUC São Paulo.
O lançamento da atriz como dramaturga, tornou-se realidade com a escritura de “Estas mulheres”, sua primeira peça teatral. Posteriormente, o título foi alterado para “Os sinos dobram por elas”. Redação baseada na temática racial: mulheres negras que ficaram psicologicamente sequeladas, por conta da violência insana que sofriam. Estreou no Teatro Arthur Azevedo em 1995, colocando em cena mais de vinte intérpretes negros, entre homens e mulheres. O objetivo do espetáculo foi mostrar a mulher como elemento primordial, em um mundo que subverte toda a concepção machista, que de há muito figura na sociedade como um todo.

DIRCE THOMAZ EM “XICA DA SILVA”
FOTO MANDELACREW. IMAGENS DE ARQUIVO CEDIDAS PELA ARTISTA
No ano de 2009, a autora escreve “Negras narrativas”, sobre a inquietação de cinco mulheres negras, com diferentes profissões e contextos sociais. Estudiosa obstinada da cultura afro-brasileira, a começar pela COMPANHIA NEGRA DE REVISTA (1920), depois, o TEATRO EXPERIMENTAL DO NEGRO (1940) e assim prosseguindo, o TEATRO POPULAR BRASILEIRO (1950), de Solano Trindade.
Na sequência, Dirce centralizou suas pesquisas, nas vozes da negritude tangentes à música e à literatura, estudando os sambas da cantora Clementina de Jesus e do compositor Paulo da Portela: “foi assim que me identifiquei com Carolina Maria de jesus. Em 2010, vivi esta personagem no filme ‘O papel e o mar’, de Luiz Pilar, que fala de um encontro fictício entre Carolina e o velho ex-marinheiro rebelde, João Cândido Felisberto, líder da Revolta da Chibata, interpretado por Zózimo Bulbul”.

DIRCE THOMAZ EM “EU E ELA - VISITA A CAROLINA MARIA DE JESUS”
FOTO MANDELACREW. IMAGENS DE ARQUIVO CEDIDAS PELA ARTISTA
O mais recente desempenho teatral de Dirce, foi “Eu e ela - visita a Carolina Maria de Jesus”. Trabalho solo, em que, além de atuar, assina a direção, a criação e a trilha sonora em parceria com Marco Xavier, além do figurino e dos adereços. Estreou em 13 de novembro de 2017, no CEU Jambeiro, na zona leste da capital paulista. Passou por outros auditórios e permaneceu em temporada bastante elogiada, no Teatro Studio Heleny Guariba e na Funarte, também em São Paulo.

DIRCE THOMAZ EM “XICA DA SILVA” - 1988 - SEUL, COREIA
FOTO MANDELACREW. IMAGENS DE ARQUIVO CEDIDAS PELA ARTISTA
A atriz, diretora e dramaturga Dirce Thomaz, exerceu atividade na área de relações raciais da Prefeitura de São Paulo. Paralela a esta função, escreveu, baseada nas referências moçambicanas e na Exposição Banco do Brasil África, um texto dramatúrgico intitulado “A precursora das Ideias” sobre o grupo étnico africano dos Macondes, um ramo dos povos Bantu que vive na Tanzânia e em Moçambique, conhecidos mundialmente por suas máscaras e esculturas em madeira. Trabalho este encenado nos anos de 2010 a 2014.
Ela espera reencenar também um espetáculo comemorativo aos 31 anos da peça “Xica da Silva”, desta vez apresentando novas faces da personagem. “É minha reverência à emblemática Xica e ao espírito mineiro de meus pais e de meus irmãos mais velhos. Não focarei na escravidão, mas na energia guerreira plasmada na identidade daquela mulher negra”.
Os saltos e acrobacias desta equilibrista da vida Dirce Thomaz, são cada vez mais ousados e arriscados. Com ela, o negro terá sempre sua palavra, sua voz, seu grito, ouvido por um mundo que clama pela defesa da diversidade e ascensão das minorias.
A você Dirce, nossos sinceros aplausos de reconhecimento e admiração.

DIRCE THOMAZ EM “XICA DA SILVA”
FOTO MANDELACREW. IMAGENS DE ARQUIVO CEDIDAS PELA ARTISTA

“Tive muita fama, mas não ganhei dinheiro. As pessoas me viam na rua e deviam indagar umas às outras: ‘será que é ela?’ E deviam concluir que não, pois achavam que eu não andaria de ônibus nem de metrô”
Texto inspirado nas análises críticas de OSWALDO FAUSTINO, jornalista, escritor, dramaturgo e roteirista. Bacharel em Comunicações Sociais pela FIAM/FMU. Pesquisador de assuntos relacionados às questões étnico-raciais.
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